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Do tarifaço à crise de metanol: como 2025 afetou as pequenas e médias empresas — e como elas reagiram
Carga tributária alta ao longo do ano, tarifaço e crise do metanol foram alguns dos acontecimentos que marcaram os empreendedores durante o ano de 2025. O cenário do ano resultou em queda temporárias de vendas e aumento de custos operacionais para as pequenas e médias empresas, que precisaram se adaptar.
“Crescimento com sufocamento”. É com essa expressão que Nasser Mahmoud Hasan, professor do curso de Administração do Centro de Ciências e Tecnologia da Universidade Presbiteriana Mackenzie (Campus Campinas), sintetiza o período. “De um lado, a economia andou, o mercado de trabalho continuou aquecido e o consumo de bens essenciais se manteve. De outro, a combinação de juros muito altos, tarifaços e endividamento recorde estrangulou o caixa de milhões de pequenos negócios”, analisa.
O ano de 2025 fez com que as empresas precisassem seguir novas regulamentações e contornar acontecimentos nacionais e internacionais. Relembre o que afetou as PMEs em 2025:
Tarifaço
Em agosto deste ano, entrou em vigor a aplicação de uma tarifa de 50% sobre parte das exportações brasileiras. Em novembro, porém, o governo estadunidense retirou parte das taxações de produtos como café, carnes e frutas. Mesmo com o recuo de alguns setores, pequenas e médias empresas sentiram o impacto econômico e estrutural. “O tarifaço não apenas reduziu receita, mas também aumentou custos e pressionou a sustentabilidade financeira das pequenas e médias empresas, exigindo estratégias agressivas de diversificação e eficiência para sobreviver”, opina o professor de finanças e reitor do Ibmec-RJ, Samuel Barros.
Os impostos afetam, em especial, as empresas que exportam, e também aquelas que fornecem insumos para essas. O principal impacto foi a redução da competitividade dos produtos brasileiros nos EUA, levando à queda de pedidos e à necessidade de renegociar contratos. “Para muitas PMEs, isso significou elevação de custos operacionais, já que a produção ficou ociosa e os insumos adquiridos não encontraram saída, e, em diversos casos, despesas adicionais com armazenagem e logística para redirecionar estoques”, adiciona Barros.
As empresas tiveram ainda que buscar mercados alternativos, como a América Latina e a Europa. “Nem todas conseguiram se adaptar rapidamente, resultando em fechamento de negócios menos capitalizados”, diz.
Para o professor da Faculdade Getúlio Vargas (FGV), José Mauro Nunes, o impacto principal foi para o agronegócio e para as empresas que atendem o setor. Ele acredita que os efeitos foram temporários. “Houve uma turbulência no meio do ano, mas essa turbulência está sendo corrigida aos poucos”, fala. Porém, para Hasan, o impacto chega ainda em 2026, com uma “reconfiguração das cadeias de exportação que ainda pesam sobre PMEs inseridas na base de grandes exportadores, com demanda menor e contratos renegociados.”
Metanol
Em setembro, os primeiros casos de intoxicação por metanol em bebidas destiladas começaram a aparecer. Segundo o Ministério da Saúde, foram 890 notificações entre 26 de setembro e 5 de dezembro, com 73 confirmados, sendo 22 óbitos. Em 8 de dezembro, o ministério considerou o cenário estável – com o último caso registrado em 26 de novembro.
Apesar do fim da crise, os casos influenciaram no movimento de bares e restaurantes, afetados pela desconfiança dos clientes. Em São Paulo, 26% dos estabelecimentos relataram quedas na venda. “É uma cadeia dominada por PMEs. Nos bares e restaurantes, a percepção de risco afastou a clientela e derrubou o consumo de destilados, reduzindo o tíquete médio mesmo em estabelecimentos corretos”, avalia Hasan.
“A confiança do consumidor foi duramente abalada, com clientes migrando para redes maiores ou marcas com maior credibilidade, deixando os pequenos negócios em desvantagem competitiva”, complementa Barros.
O professor da Mackenzie avalia que pequenos distribuidores de bebidas também foram afetados: “houve descarte de lotes suspeitos, queda de pedidos, aumento de custos com logística reversa, laudos e reetiquetagem”, explica.
O caso resultou em maior transparência sobre os processos de restaurantes, que suspenderam as vendas de destilados ou deixaram notas fiscais à mostra aos consumidores, e dos distribuidores, que precisaram garantir rastreabilidade.
“Hoje, quem quer vender para redes de varejo, plataformas de delivery e bares mais estruturados precisa comprovar com muito mais rigor a origem, o controle de qualidade e a regularidade dos produtos. Segurança e transparência deixaram de ser “diferencial” e passaram a ser requisito mínimo de sobrevivência”, fala Hasan.
Para Barros, as festas de final de ano são uma forma dos empreendedores avaliarem se a reputação continua ou se é preciso tomar novas medidas de comunicação com os consumidores, por exemplo. “Se houver um aumento do consumo, chegando a patamares de anos anteriores, podemos assumir que o pior já passou e que o consumidor voltou a confiar no produto, o que pode aliviar os produtores artesanais e os pequenos bares”, fala.
Megaoperações
Esquemas bilionários foram deflagrados em 2025, como a Operação Carbono Oculto, que utilizava fintechs para desviar dinheiro. A descoberta desses esquemas resultou em uma nova regulamentação para as startups de soluções financeiras, que passaram a ser consideradas instituições financeiras, sendo obrigadas a reportar as movimentações.
A mudança foi considerada positiva para a Associação Brasileira de Fintechs, já que gera maior credibilidade a essas empresas, trazendo mais consolidação a longo prazo. Por outro lado, a adaptação à regulamentação gerou mais gastos às fintechs. “Esses ajustes aumentaram significativamente os custos operacionais, pressionando margens e comprometendo a sustentabilidade de players menores, que tiveram de destinar recursos para tecnologia antifraude e equipes especializadas”, aponta o professor da Ibmec.
Fenômenos climáticos
Empresas de diversos setores foram afetadas por eventos climáticos extremos ao longo do ano. Chuva e ventos causaram apagões pelo Brasil, em especial, na capital paulista. O apagão, iniciado no dia 10 de dezembro, por exemplo, durou mais de cinco dias em alguns imóveis, resultando em perda estimada de ao menos R$ 2,1 bilhões para o setor de comércio e serviço de São Paulo, segundo a FecomercioSP.
Interrupção das operações, perdas de estoque, danos a equipamentos, atrasos logísticos, comunicação com clientes, queda no faturamento e aumento de custos operacionais, com a contratação de geradores, por exemplo, são alguns dos impactos dos eventos extremos (seja pela falta de energia, seja por alagamentos).
“As pequenas e médias empresas foram particularmente impactadas por eventos climáticos extremos e por apagões elétricos, devido a menor capacidade de absorver choques e à alta dependência de infraestrutura básica”, analisa o professor da FGV. “No curto prazo, a reação foi improvisada: reorganizando horários de funcionamento, transferindo operações para canais digitais quando possível, renegociando prazos com fornecedores e clientes, e recorrendo a crédito emergencial. Algumas adotaram soluções pontuais, como geradores, armazenamento extra ou trabalho remoto parcial”, adiciona Nunes.
Cenário econômico
Os especialistas ainda apontam que os empreendedores passaram por uma pressão estrutural contínua. Os juros se mantiveram altos, o que deixou os investimentos travados. Enquanto isso, a carga tributária se manteve alta, aumentando custos operacionais e reduzindo a competitividade. “A carga tributária no país ainda é muito elevada e isso incide na capacidade de geração de novos negócios e na capacidade de manutenção, afetando, em especial, as pequenas e médias empresas”, ressalta Nunes.
A incerteza quanto as mudanças da Reforma Tributária também impactam as PMEs, trazendo maior dificuldade de planejamento. "São dois impostos novos que vão incidir sobre quase tudo o que as empresas vendem. Mas, como ainda há incertezas sobre regras específicas e sobre o futuro do Simples, muitas PMEs, sobretudo de serviços, não conseguem enxergar com clareza qual será a sua carga tributária nos próximos anos", acrescenta Hasan. Sem clareza durante o ano, a fase prática e possíveis adaptações devem ser consolidadas em 2026.
Ainda, os custos de energia se mantiveram altos ao longo do ano, sendo um dos “principais vilões” para pequenos negócios. Para Barros, parte das empresas aceitaram os valores (que impactam na receita final), enquanto outros tentaram contornar: “Quando possível, houve a migração para o mercado livre de energia e a troca de equipamentos por outros mais eficientes”, exemplifica.
O que fica para 2026?
Para os especialistas, a alta carga tributária e custos de energia devem seguir para 2026. Os empreendedores afetados pelo tarifaço devem continuar atentos à manutenção ou redução de impostos. Mudanças regulamentares, como as das fintechs, seguem valendo, o que torna necessário entender se as medidas tomadas neste ano foram suficientes ou se é necessário adaptações. “É preciso rever a estrutura de custos e reformular propostas de valor e custos”, diz Nunes.
O professor da Mackenzie ainda sugere revisão de portfólio e modelo de negócio. “Eliminar produtos, canais e clientes que destroem valor num ambiente de capital caro e energia cara, e concentrar recursos no que tem maior margem e menor risco regulatório.”
A crise do metanol e os casos de lavagem de dinheiro também reafirmam a importância de checar rastreabilidade de produtos e serviços em 2026. “Tenha documentação, checagem básica e histórico dessas relações, além de rastreabilidade de produtos e serviços”, complementa Hasan.
Fonte: Pequenas Empresas & Grandes Negócios

